agora: futuro antigo V
Hoje é Dia Internacional da Trabalhadora e do Trabalhador Domésticx!
Nacionalmente, embora não oficial, a data é comemorada em 27 de abril – no dia de celebração de Santa Zita, considerada padroreira das empregadas domésticas.
Foi pelo perfil da Veronica Oliveira no Instagram – o Faxina Boa -, que relembrei desse dia tão importante e de Joe Paul Simenn: um trabalhador doméstico da Califórnia, que em 1921, para visitar esposa e filhos que não via há muito tempo porque seus patrões não lhe autorizavam a tirar um dia de folga, teve uma ideia e inventou que, nos dias 21 e 22 de julho comemorava-se o Dia do Serviçal, e que patrões que não concedessem a folga a suas/seus empregadxs, seriam punidos pela justiça. A notícia se espalhou pelos arredores, o movimento de Simenn ganhou força e outrxs trabalhadorxs foram dispensados por seus patrões movidos pelo medo dessa punição.
A data é comemorada há 100 anos nos Estados Unidos e tudo isso me lembrou, ainda, o bonito e potente filme “Guava Island”, com Childish Gambino e Rihanna como protagonistas, disponível na Amazon Prime Video – mas essa é outra história.
A profissão foi legislada pela primeira vez no Brasil em 1972 (Lei 5859/72). Após passar por diversas mudanças, a Lei Complementar 150/2015 afirma que “o empregado doméstico” seria “aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana” e que, “é vedada a contratação de menor de 18 (dezoito) anos para desempenho de trabalho doméstico, de acordo com a Convenção nº 182, de 1999, da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e com o Decreto nº 6.481, de 12 de junho de 2008”.
São consideradxs domésticxs, também, empregadxs que prestam serviços para condomínios, prédios e conjuntos residenciais, por exemplo. Caso a residência seja utilizada para alguma atividade profissional, como consultório, ou para produção e comercialização de produtos, xs trabalhadorxs deixam de ser consideradxs domésticxs.
No Brasil, há mais de 6 milhões de trabalhadorxs domésticxs, sendo que, aproximadamente, 72% delxs não tem registro em carteira, sendo privadxs de seu acesso aos direitos conferidos pela legislação.
Com a revolução no horizonte, torna-se evidente que os recursos que o capitalismo usa para sua manutenção reproduzem suas características fundamentais, dentre elas, o racismo, o machismo, a desigualdade social, a devastação ambiental, sendo, também, esses recursos de manutenção - como a legislação - irrealizáveis: é impossível que a contratação de uma ou mais pessoas para realizar todo o trabalho doméstico de um lar, não gere lucro para a/o contratante, na sociedade em que tempo – de estudo, trabalho não doméstico, lazer, vida – é dinheiro. Isto sem mencionar todo o trabalho doméstico realizado que não é remunerado e a invisibilização da mulher no mercado de trabalho, temas sobre os quais Hildete Pereira de Melo, professora de economia da Universidade Federal Fluminense (UFF) e vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos do Trabalho (Abet), pesquisa desde 1978, e sobre os quais há conteúdos acessíveis pela internet em vídeos, textos e matérias, como “Trabalho doméstico não remunerado vale 11% do PIB no Brasil”, publicado na revista Carta Capital em junho de 2017.
As categorias de trabalhadorxs domésticxs são: trabalhadores dos serviços de limpeza e domésticos em geral, mordomos e governantas, cozinheiros, camareiros, roupeiros e afins, garçons, barmen, copeiros e sommeliers, trabalhadores auxiliares nos serviços de alimentação, churrasqueiros, pizzaiolos e sushimen, trabalhadores nos serviços de administração de edifícios, trabalhadores nos serviços de manutenção de edificações, cuidadores de crianças, jovens, adultos e idosos, lavadores e passadores de roupa à mão, vigilantes e guardas de segurança, porteiros e vigias, jardineiros, caseiros, motoristas, marinheiros. As categorias são grafadas, em geral, no gênero masculino, apesar de serem, majoritariamente, realizadas por mulheres, em especial quando relacionadas aos “cuidados” com pessoas, lares e ambientes em que vivem.
Minha família é composta de diversas trabalhadoras domésticas e trabalhadores domésticos remuneradxs e não remuneradxs, desde à mais antiga geração de que temos notícias, que, infelizmente, é recente, e muitas vezes a combinação desse trabalho com outros, configurou e configura jornadas duplas - triplas...
O cuidado segue sob responsabilidade das mulheres nesse contexto pessoal e global e, a partir de minha experiência nas áreas de educação, saúde e cultura, identifico padrões idênticos ou, no mínimo, com muitas semelhanças, já que profissões relacionadas ao cuidado na educação infantil, na pediatria, geriatria, na manutenção de escolas e hospitais, em funções de produção executiva em projetos e eventos culturais estão, também, sob a responsabilidade das mulheres.
Relembrei desse dia tão importante e vim aqui escrever, para partilhar um pouco sobre a pesquisa teórica, prática e artística, que está em curso sob o título “A Anfitriã” – uma festa-cênica, que entre outras coisas celebra e visibiliza essas trabalhadoras infinitas e fundamentais. O diálogo se expande dia a dia e convidei, além da Veronica Oliveira (comunicadora, autora do livro “Minha Vida Passada a Limpo”, ex-diarista e “inspiradora digital”), que mencionei no começo desse texto, Izilda de Toledo (pedagoga ativista, especialista em Educação Étnicorracial, palestrante e docente do Ensino Superior, cursando Pedagogia Feminista Negra pela Universidade Estadual de Feira de Santana- Departamento de Educação) e Geni Nuñez (guarani, ativista anticolonial, mestre em Psicologia Social e doutoranda (UFSC)), para palestras e bate papos, para ouvirmos suas perspectivas sobre “o cuidar sob responsabilidade das mulheres na sociedade”.
Enquanto aguardamos respostas de viabilização desse projeto, sugiro acompanhá-las para seguirmos aprendendo, criticando e mudando nossa realidade, rumo à revolução!
@faxinaboa
@izildatoledo
@genipapos
Livremente inspirado na obra, Eu continuava procurando o quadrado. Continuava com medo da atriz. Apaguei, tão logo escrevi.
(Foco no figurino cósmico até chegar no rosto da atriz, que nos encara e questiona) Eu continuava procurando o quadrado. Continuava com medo da atriz. Apaguei, tão logo escrevi. Quando reli, pensei que talvez quisesse ter escrito que continuava com medo do amor (da morte?) e que havia apagado tão logo escrito – o que seria a mesma coisa, ou quase a mesma coisa, já que a atriz e o amor (a morte?) são a mesma coisa ou quase a mesma coisa.
Mesmo agora, agorinha mesmo, eu tenho medo da atriz – do ruído abafado de seus passos no palco de madeira, do farfalhar das camadas de tecido do figurino delicadamente ajustado e costurado junto ao seu corpo, da sua silenciosa respiração, da luz dos refletores refletida em seus olhos, do ar que escapa pelos lábios entreabertos, do coração acelerado. Gotículas se formam acima da camada espessa de maquiagem e, no caso desta atriz especificamente, o rubor mancha a face. A atriz está quente. A atriz é aterrorizante! Você não acha? No escuro, ela avança.
Ensaio aberto para uma peça ou herbário.
"A palavra morre Quando é dita,
Alguém diz.
Eu digo que ela começa
A viver
Naquele dia"
Emily Dickinson
[1830-1886]
Um corpoema para cada vez que eu deixei de ensaiar uma cena para colher plantas, colar no corpo e criar autoretratos e poemas e pensei que era por temer a atriz e o amor. Um corpoema para cada vez que eu deixei de ensaiar uma cena para colher plantas, colar no corpo e criar autoretratos e poemas: sempre foi sobre a atriz e o amor.